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Entre a Razão e a Emoção: a experiência pentecostal do Espírito



1. A experiência pentecostal do Espírito

Para o pentecostal clássico, a sua experiência do Espírito está arraigada na experiência pneumatológica do Povo de Deus do Antigo e Novo Testamentos. O Pentecoste (At 2) não é interpretado como uma doutrina, uma religião ou um mero movimento, mas uma experiência transformadora. O pentecostal olha para os corredores da história em busca de referências que justifiquem sua experiência e identidade. Por meio da leitura fundamentalista da Bíblia, justifica sua experiência interpretando a experiência pneumatológica do povo de Deus à luz de sua teologia existencial e pessoal. Por meio da leitura da vida de personagens da história eclesiástica identifica sua experiência recente como a continuidade da ação do Espírito no passado. O pentecostal admira, reconhece, inspira-se e identifica-se com personagens bíblicos e modernos que experimentaram a presença do Espírito. Daí a razão pela qual as pregações pentecostais valorizam tanto as ações prodigiosas de personagens como Elias e Eliseu, no Antigo Testamento, e Pedro e Paulo em o Novo Testamento. Assim, para o pentecostal, o Espírito que agiu no passado é o mesmo que age no presente na conversão, na santificação, nas curas, na manifestação dos carismas espirituais e principalmente no batismo no Espírito Santo. Segundo a crença do pentecostal, ele é um dos canais ou instrumentos para as realizações da obra do Espírito no mundo, assim como foram muitos personagens nas Escrituras. Contudo, cabe ressaltar que a expressão “instrumento”, situa-se inadequada e até mesmo retrógada dentro do contexto de autonomia do ser na modernidade quando considerada filosoficamente. O termo não é bíblico e muito menos teológico.

 2. A Experiência do Espírito na Modernidade

Por razões pedagógicas e de síntese, a experiência pentecostal do Espírito será descrita em quatro ênfases: pessoal, pneumatológica, litúrgica e comunitária.

2.1. A experiência do Espírito: ênfase pessoal

A primeira experiência do Espírito para o cristão pentecostal é a experiência salvífica, que inclui a conversão, a regeneração, a justificação e a santificação. Compreendidas como obras simultâneas operadas por Deus por meio do Espírito Santo, cuja participação na economia salvífica é acentuada ao lado de Cristo. A teologia pentecostal define, por exemplo, a regeneração (gr. palingenesia, Tt 3,5) como “uma obra efetuada por Deus através do Espírito Santo, pelo qual o homem recebe a vida pessoal de Deus, transformando sua mente, seu coração e sua vontade, de tal maneira que sua inclinação para consigo é mudada, pondo Cristo no centro de sua vida”. A ministração salvífica do Espírito para o pentecostal transforma a natureza pecaminosa do indivíduo em uma nova vida, uma nova criatura. Na vida prática isto levará ao abandono do pecado, dos vícios, da prostituição. A primeira e mais importante experiência individual do Espírito ocorre no plano salvífico. Essa experiência é confessada através dos testemunhos pessoais na evangelização, na pregação e no culto.

2.2. A experiência do Espírito: ênfase pneumatológica

A segunda mais importante experiência pneumatológica para o pentecostal é o batismo no Espírito Santo com evidência inicial de falar noutras línguas. O cristão pentecostal tem um sentimento de pertença à tradição apostólica de Atos 2 por meio da experiência do batismo no Espírito Santo. De acordo com a doutrina pentecostal, trata-se de uma experiência separada, lógica e teologicamente, da conversão, do batismo no corpo de Cristo (1Co 12.13) e do batismo em águas (Mt 28.19). Trata-se de uma experiência pneumatológica em que o crente é totalmente imerso no Espírito, daí baptzô, imergir. Os relatos da experiência de batismo no Espírito Santo são variados, pessoais e não repetitivos, disto resulta a subjetividade da experiência. Não há como transferir, reproduzir ou transmitir a mesma experiência a outros. Cada um deve ter sua própria experiência de batismo no Espírito Santo. Nos relatos de recebimento de batismo no Espírito são narradas visões espirituais por alguns, forte comoção por outros, no entanto, a maioria concorda em uma vocação específica para a evangelização e obra missionária, para a santidade pessoal, para a pregação da palavra, para a vida comunitária, exercício de um dos carismas espirituais, e gozo salvífico. A recepção da experiência batismal no Espírito também é acompanhada por uma forte oralidade e êxtase. O êxtase não nega, desvaloriza ou destrói a estrutura humana como ocorre com a possessão, uma vez que Deus não precisa destruir a natureza humana para se manifestar nela. A experiência do batismo não destrói a consciência ou a deixa “infrutífera”. Apesar de ser um estado de êxtase, o batizado está cônscio de sua experiência a ponto de poder relatá-la racionalmente.

No pentecostalismo clássico, funções eclesiásticas como educação cristã, diaconia, cargos de liderança e pastoreado só podem ser exercidos se a pessoa for batizada no Espírito Santo. Isto, obviamente, acentua a importância que o movimento dá ação do Espírito capacitando o crente ao exercício da obra de Deus, muito embora haja nos dias hodiernos grupos de cristãos pentecostais que se interrogam a respeito da validade de tal princípio.

2.3. A experiência do Espírito: ênfase litúrgica e comunitária

A terceira e quarta experiência mais enfatizada pelo pentecostal é a celebração comunitária da salvação em Cristo. Com ênfase comunitária e conversionista são destacados os testemunhos pessoais de curas, de milagres, de bênçãos materiais, de casamento e eventos prodigiosos, seguidos de cânticos congregacionais e adoração intimista. Em cada destaque, a ação, o poder e a experiência do Espírito são anunciados como elementos contemporâneos e proféticos: o que o Espírito fez a um pode fazer ainda que de modo diferente a todos. Os símbolos (óleo, fogo, pompa, selo) e o poder do Espírito são enfatizados tanto quanto a pessoa do Espírito. É o Espírito que fala e dirige o culto, o crente, a liturgia, tudo mediado pelo seu instrumento: alguém (ele ou ela) batizado no Espírito Santo.

3. Pentecostalidade e saber racional

Embora haja no Brasil certa produção teológica pentecostal (nacional e estrangeira), o pentecostal ainda hoje enfatiza mais a experiência do Espírito do que a teologia. A experiência do Espírito e a teologia, a emoção e a razão, a crença interiorizada e o saber racional há muito são vertentes difíceis de reconciliar para os pentecostais. Donald Gee, um dos principais expositores do pentecostalismo clássico, afirmou certa vez que “é preciso que as igrejas pentecostais [...] acrescentem ao nosso ardente testemunho de experiência [...] esforço intelectual mais determinado a fim de expor com precisão a nossa fé. Não devemos nos deleitar com emoções profundas à custa de reflexões superficiais”  [1].

Esdras Costha Bento

Cpadnews

[1] GEE, D. Como Receber o Batismo no Espírito Santo. 6 ed., Rio de Janeiro: CPAD, 2006. p 68-69. Ver também PALMA, A. D. O batismo no Espírito Santo e com fogo: fundamentos bíblicos e a atualidade da doutrina pentecostal. Rio de Janeiro: CPAD, 2002.

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